Manoel da Pipa 20 anos de alegria no Macacos
Elas estão em todas as comunidades. Basta olhar para cima. Não tem erro. As pipas são garantia de diversão para crianças de todas as idades e até adultos. Os modelos são diferentes, as cores também, mas a alegria é sempre a mesma. E basta que uma seja cortada, para todas as crianças correram atrás das pipas. Eu estava outro dia no Morro dos Macacos quando conheci o pipeiro Manoel Inácio Rodrigues. Sempre soube que soltar pipa era a brincadeira preferida das crianças de favela, mas não tinha ideia da dimensão disso, não imaginava a incrível quantidade de vendas durante a época de férias escolares. Até conversar com o Manoel, que há mais de 20 anos vende pipa no Morro dos Macacos.

Ele me contou que faz de 25 a 30 mil pipas por temporada – são duas épocas, que têm início em julho e dezembro. No auge das férias escolares, a banca trabalha com três funcionários atendendo as crianças. E muitas vezes não dá conta. A barraquinha atualmente está localizada dentro do terreno do Brizolão, ao lado de uma quadra de futebol. Manoel tem vários modelos de pipa e os valores variam de R$ 0,50 a R$ 2,50 já com uma rabiola pequena. Mas quem quiser comprar linha ou aumentar a rabiola também consegue.
– Me alegra ver essas crianças brincando, eu me sinto como uma delas. Pode ter certeza que jamais vou dizer não se uma crianças dessas vier aqui e me pedir uma pipa. Tenho muito amor por todas elas. Essa foi a temporada que mais vendi pipa, mas não sei se tem relação com a UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) – garante Seu Manoel, que não mora mais na comunidade e atualmente vive com a esposa em outra favela da Tijuca.
A pipa na verdade é um hobby. A profissão de origem é serralheiro. São mais de 40 anos trabalhando, principalmente, com esquadrias de alumínio. A paixão pelo papagaio de papel surgiu depois que Manoel cansou de fazer balões. Hoje ele participa de todas as etapas de produção da pipa. Vai no Centro, compra o material, faz a fôrma, cola o papel e monta a rabiola. O lucro pode chegar a R$ 400 em apenas um fim de semana. Mas essa não é o único objetivo.- Não precisaria estar aqui, poderia viver com o que ganho como serralheiro. Mas adoro trabalhar para a alegria dessas crianças.
Todas as minhas pipas saem daqui com um carimbo: Alegria no Céu, Paz na Terra.Nesses 20 anos de trabalho no Morro dos Macacos, a barraca já mudou de lugar por quatro vezes. Ao lado da esposa, Manoel começou na entrada da comunidade. Depois foram para a calçada mesmo, até serem transferidos para um quiosque na localidade conhecida como shoppinho. Mas foi na quadra, onde estão agora, que aconteceram os grandes sustos. O pipeiro lembra com tristeza a quantidade de vezes que precisou se esconder dentro da barraca durante troca de tiros entre policiais e bandidos.
– O morro estava calmo e do nada explodia tudo, acabava o dia e eu não conseguia sair da comunidade, só na sorte mesmo.
Muitas vezes precisei me esconder aqui dentro da barraca por causa dos tiros. Com a chegada da UPP melhorou porque as guerras acabaram e agora as crianças não precisam mais sair correndo também – explica Manoel, que nunca teve problema com os traficantes que viviam no Morro dos Macacos:
– Eu moro em um comunidade que era de uma facção diferente da deles. Mas nunca tive problemas com isso. Desde o começo expliquei que queria apenas fazer o meu trabalho. Muitos eu conhecia de crianças e vi virarem homens. Sempre conversei muito com eles aqui na barraca mesmo.O cuidado agora é com os acidentes. Segundo Manoel, muitas crianças caem das lajes soltando pipa. Olhando para cima, elas não prestam atenção e acabam se machucando feio. Na última temporada foram quatro acidentes graves no Morro dos Macacos.
– Eles precisam tomar mais cuidado quando estão soltando a pipa nas lajes. E também quando correm atrás das pipas que cortam. Não é perigoso, mas precisa ser feito com atenção – pede Lucia Gomes Rodrigues, esposa de Manoel.
No pouco tempo que ficamos conversando, é impressionante a quantidade de crianças que procura a barraca para comprar pipa. Elas não param de chegar. Algumas apareceram até duas vezes em um curto espaço de tempo.
– A pipa dura pouco. A gente coloca no alto e corta ou é cortado. Aí volta para comprar outra – disse um dos meninos.